quinta-feira, 16 de julho de 2009

Cientistas criam fotografia transgênica

Enquanto a fotografia tradicional por emulsão química briga com a recente revolução das fotos digitais, um grupo de pesquisadores nos Estados Unidos acaba de criar a forma mais improvável de obter imagens --fotos biológicas.

Reprodução
Biofilme mostra o "monstro de espaguete voador"
Biofilme mostra o "monstro de espaguete voador"
Parece inacreditável, mas o grupo liderado por Christopher Voigt, da Universidade da Califórnia em San Francisco, conseguiu usar criaturas vivas para produzir imagens fotográficas. O breve relato do feito está registrado na edição de hoje da prestigiosa revista científica britânica "Nature" (www.nature.com).

Para conseguir o "biofilme fotográfico", os pesquisadores usaram a famosa Escherichia coli, bactéria "pau-para-toda-obra" dos laboratórios espalhados pelo mundo afora. Mas não eram as versões usuais dessa bactéria. Eles tiveram de "engenheirar" a bichinha, dotando-a de uma substância sensível à luz. De princípio, os cientistas decidiram usar esse tal fotorreceptor de uma cianobactéria --criatura unicelular marinha que faz fotossíntese e, por isso, tem essa capacidade especial de reagir à presença de luz.

"Mas não deu muito certo, então tivemos de criar um fotorreceptor que é uma mistura de uma proteína que a E. coli tem com o pedaço que nos interessava da cianobactéria", explicou à Folha, por telefone, Voigt. "É o que chamamos de proteína-quimera [que combina características de dois organismos diferentes]."

Programação adequada

Para completar o esquema, os cientistas precisaram também incluir o "software", ou seja, a programação biológica, para que a coisa funcionasse --adicionaram dois novos genes, tirados da cianobactéria, ao genoma da E. coli.

Funcionou. Ao serem expostas à luz (vermelha, no caso), as bactérias reagiam e mudavam de tom. Cada célula individual agia como um pixel (ponto, no jargão das imagens digitais).

O princípio é basicamente o mesmo da fotografia convencional. No caso de um filme tradicional, a substância química sobre ele é que é sensível à luz, a ponto de "marcar" a incidência da luz. No caso das fotografias digitais, pequenos sensores fazem esse trabalho, guardando um código de cor para cada pixel.

Trocando os pixels por bactérias, o resultado é impressionante.

Como esses seres unicelulares são criaturas muito pequenas, a resolução obtida foi extraordinária --100 milhões de pixels (ou cem megapixels) por polegada quadrada. Basta lembrar que boas câmeras digitais por aí fazem fotografias muito boas com resolução de seis megapixels para entender o que isso significa.

Esforço rápido

Embora pareça complicado, o trabalho não levou muito tempo para ser realizado. Ele parece mais fruto de uma boa idéia do que de grandes ações mirabolantes. "Para executar isso, nós precisamos de cerca de quatro meses, então não foi particularmente difícil", conta Voigt. "Mas então gastamos um ano aperfeiçoando o sistema. O mais difícil foi adaptar o fotorreceptor para a E. coli."

Por enquanto, as imagens obtidas são apenas em preto e branco, mas, segundo Voigt, os cientistas já planejam melhorar o material para obter imagens coloridas.

No entanto, é bom que ninguém pense que fotos biológicas vão substituir as químicas ou as digitais. "Nem sonhamos em fazer uma coisa desse tipo", diz o líder da pesquisa. "Essa técnica não seria nem um pouco adequada para isso." Natural, uma vez que bactérias são entidades muito menos controláveis e previsíveis do que uma substância química ou uma máquina digital.

O que os cientistas querem é usar o método para observar a ativação de certos genes. Por exemplo: nos experimentos reportados agora, eles sabem, ao deixar luz bater sobre o "filme biofotográfico", que os genes inseridos nas E. coli estão funcionando direitinho.

A idéia é usar o mesmo método, só que multiplicando sua capacidade, ao atribuir uma cor diferente para cada gene. De posse desse "biofilme", os cientistas poderão verificar se as bactérias estão mesmo ativando ("expressando", no termo técnico) esses genes como esperado. "É uma forma de monitorar a expressão genética."

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